Ferramenta ou Ameaça? O Que os Roteiristas de Hollywood Pensaram sobre a IA em 2025

A Inteligência Artificial deixou de ser apenas um elemento de filmes de ficção científica para se tornar a protagonista de um dos debates mais quentes da indústria do entretenimento.

ESCRITA CRIATIVA COM IA

Raniere Menezes

12/11/20254 min read

A Inteligência Artificial deixou de ser apenas um elemento de filmes de ficção científica para se tornar a protagonista de um dos debates mais quentes da indústria do entretenimento.

Desde a histórica greve do sindicato dos roteiristas (WGA) em 2023 até o cenário atual, no final de 2025, a tensão entre a inovação tecnológica e a preservação da arte humana continua a dividir opiniões.

Enquanto alguns veteranos começam a ver a IA como um motor para a criatividade, a grande maioria dos roteiristas mantém um pé atrás — e outro na porta dos estúdios — por medo de substituição, plágio e, acima de tudo, da perda da "alma" na narrativa.

Se você quer entender onde está a cabeça de quem escreve seus filmes e séries favoritos hoje, aqui está um panorama das principais discussões que circulam nos bastidores de Hollywood.

O Argumento a Favor: O Fim do Bloqueio Criativo

Para uma minoria vocal e respeitada, a IA não é a vilã da história, mas sim a assistente mais rápida do mundo. A surpresa vem de onde menos se espera: Paul Schrader, o lendário roteirista de clássicos como Taxi Driver e Touro Indomável.

Schrader chocou puristas ao relatar que testou o ChatGPT para gerar conceitos de filmes e ficou genuinamente impressionado. Segundo ele, as ideias que a IA gerou em segundos eram boas, originais e bem desenvolvidas. O argumento de Schrader é pragmático: por que um roteirista deveria ficar sentado por meses encarando uma parede em branco em busca de uma ideia, se a tecnologia pode oferecer um ponto de partida instantâneo? Para ele, a IA atua como uma aceleradora, tirando o autor da inércia inicial, sem necessariamente substituir o trabalho de escrita final.

O Medo da "Armadilha" da Mediocridade

No entanto, a visão otimista de Schrader não é a regra. A maior parte da classe artística vê riscos existenciais que vão muito além da conveniência.

Mark Frost, co-criador da cultuada série Twin Peaks, é direto em sua crítica: para ele, a IA não é amiga do escritor. Frost e outros críticos, como David Ehrlich (do IndieWire), argumentam que a tecnologia favorece a mediocridade. Como os modelos de linguagem operam baseados em padrões de dados passados, eles são excelentes em recriar o que já foi feito, mas terríveis em inovar. O medo é que isso gere uma cultura estagnada, repleta de clichês e variações das mesmas histórias, sem nunca apresentar algo verdadeiramente novo.

Além da qualidade, existe o medo palpável da substituição. O ator e roteirista Blayne Weaver tem sido vocal em vídeos recentes, afirmando categoricamente que a IA vai substituir roteiristas, especialmente em tarefas repetitivas e fórmulas de gênero.

A Batalha pelos Créditos e Salários

Talvez a preocupação mais urgente seja a financeira e legal. Durante as negociações da WGA, John August (roteirista de As Panteras e membro ativo do comitê) foi uma das vozes mais firmes na defesa de que material gerado por IA não pode ser considerado "material literário".

O receio de August e de muitos colegas é que os estúdios usem a IA para gerar um primeiro rascunho ruim e, em seguida, contratem roteiristas humanos apenas para "reescrever" ou "polir" esse texto. Isso permitiria que os estúdios pagassem taxas muito menores aos escritores, tratando-os como revisores e não como criadores originais.

Essa visão é compartilhada por Alex Borstein (de The Marvelous Mrs. Maisel). Ela teme que os estúdios alimentem máquinas com dados históricos para criar "trampolins" criativos baratos, cortando os roteiristas das etapas iniciais e mais valiosas do desenvolvimento de uma história. A questão não é só arte, mas dinheiro.

O Caminho do Meio: A IA como "Leitor Beta"

Curiosamente, nem tudo é 8 ou 80. Um estudo acadêmico de 2025, que entrevistou dezenas de roteiristas, e escritores independentes como Dan Koe, apontam para um uso mais nuançado da tecnologia.

Para esse grupo, o segredo não é usar a IA para escrever, mas sim para ler. Dan Koe, por exemplo, utiliza a ferramenta como um "advogado do diabo". Ele pede que a IA leia seus argumentos e levante objeções, funcionando como um parceiro de debate incansável.

O consenso entre esses usuários moderados é que a IA pode ser útil para estruturar a trama ou verificar a lógica de uma cena, mas falha miseravelmente ao tentar replicar fluxos emocionais dinâmicos. Como disse um dos entrevistados no estudo: a criatividade humana integra emoções complexas, enquanto a IA apenas simula representações simplistas.

O Veredito

A tecnologia evoluiu, mas a essência do debate permanece a mesma: inovação versus humanidade. Graças à força coletiva da WGA, existem hoje regras que protegem os roteiristas de serem obrigados a trabalhar com IA ou de terem seus créditos roubados por máquinas.

No entanto, a pressão dos estúdios por corte de custos continua. A tendência atual sugere que a IA se tornará uma ferramenta de bastidores — útil para pesquisa, formatação e análise de estrutura — enquanto a "alma" do roteiro, aquele diálogo que faz você chorar ou a reviravolta que te deixa sem ar, permanecerá um território humano.

Afinal, como muitos roteiristas gostam de lembrar: a inteligência artificial pode simular um texto, mas ainda não aprendeu a ter um coração partido ou um sonho frustrado. E é exatamente disso que as grandes histórias são feitas.